7 de agosto de 2004

Viagem a Itália - Veneza - dia 4

Chegamos em Veneza. Cidade especial e talvez única no mundo por suas peculiaridades. Construída sobre bancos de terra e tendo rios no lugar de ruas. Sem dúvida algo totalmente diferente do que a gente está acostumado a ver.

Lembro a primeira visão que tive de Veneza. Eram 5:30 da manhã, nós estávamos muito, mas muito cansados mesmo depois de todo o episódio do trem. Sentamos no chão na saída da estação e olhamos a cidade a nossa frente. Nenhuma rua. Um grande rio logo adiante. Barcos cruzavam de um lado pro outro. Víamos pontes e casas com a porta abrindo para o rio. Que estranho!

Eu pensei: "QUE MALUQUICE! Quem é que mora num lugar desses?". É tudo muito diferente.

Não têm carros na cidade. Claro! Não existem ruas!!! Tudo é feito pelos rios: polícia, ônibus (que se chama Vaporetto), taxi, caminhão de verduras e tudo o que você imaginar. Tudo gira em torno dos rios. São realmente as ruas da cidade.

Existe uma grande "avenida" que se chama Canal Grande. Ele corta toda a cidade e é a principal veia dela. Dele se espalham diversos pequenos afluentes, se é que os posso chamar assim, que recortam toda a cidade.

Essa história de rio em vez de rua é tão peculiar que procurei na net um mapa da cidade pra mostrar a vocês mais ou menos como é. Não dá pra entender exatamente como é mas dá pra se ter um idéia.

Tomamos café por alí mesmo. Tínhamos comprado algumas coisas num supermercado na estação Termini. Enquanto comíamos reunimos forças pra seguir a pé até o albuergue. Aqui aconteceu uma pequena confusão. A gente deveria ir se registrar num outro albuergue. Não no albuergue que a gente ia ficar. Na viagem geralmente era eu quem tomava conta do mapa e das direções porque Zorbão tava sempre com uma lata de cerveja na mão e as meninas, bem, eram meninas e menina não tem muita noção de direita e esquerda quanto mais de norte, sul, leste e oeste.

Eu não sabia desse detalhe que a gente tinha que ir no outro albuergue antes e a Elen, que cuidava dessa parte, me explicou mas eu não entendi direito. Falha na comunicação.

Como era muito cedo pra chegar no albuergue decidimos então seguir ao grande, senão único, ponto turístico de Veneza: a Praça de São Marcos. Digo único porque no fim das contas a grande atração de Veneza não é uma arena romana milenar ou um relógio enorme. É a própria cidade de Veneza. A cidade é a grande atração e é o que se tem que apreciar.

A praça ficava bem perto do nosso albuergue então a caminhada da praça ao albuergue não seria tão dolorosa pra nós.

O albuergue, com alguma sorte, aceitaria o check in às 10h. Mas a gente sabia que o check in provavelmente só seria feito às 12h.

E lá fomos nós caminhando pela pequena cidade de Veneza até chegar na Praça de São Marcos.

Como a gente chegou em Veneza muito cedo eu tive a oportunidade de caminhar pela cidade completamente vazia. Foi muito interessante. Parecia que a cidade era nossa. Além de poder ter o privilégio de tirar fotos do amanhecer em Veneza.

À primeira vista a cidade me pareceu um grande favelão! A idéia que se tem é exatamente essa! Assistiram Cidade de Deus? Lembram das perseguições no meio de becos e vielas??? É A MESMA COISA! Veneza é uma coleção de becos, vielas, pontes, rios e casas velhas. A única diferença entre uma favela e Veneza é que em Veneza você passa por um beco que tem de um lado uma loja da Dolce & Gabana e do outro lado uma da Armani. Surreal!

A gente teve que caminhar a cidade inteira praticamente até chegar na Praça. E foi difícil chegar lá. Nos perdemos algumas vezes até pegarmos a manha. Por diversas vezes terminamos em "ruas" que acabavam em algum rio. E isso com sono, cansados e com uma mochila nas costas.

Mas mesmo assim eu estava maravilhado com o lugar. Pensava como podia morar gente numa cidade como aquela! Naquele monte de beco! Uma das coisas que eu falei a Léa foi: "Não adianta falar pra gente que a cidade é cheia de becos porque a gente só entende quando vem aqui!". E é verdade! Tirei algumas fotos pra tentar explicar mais ou menos pra vocês os lugares que a gente teve que passar. Em alguns becos só se passa uma pessoa por vez, por exemplo. Confira.

Depois de muito andar e conhecer a cidade inteira chegamos e vimos aquela praça linda, palco de tantos filmes e até novelas. De um lado fica a Basílica de São Marcos com toda a sua beleza original. Do outro a Praça com todo o seu charme e seus pombos.

Uma coisa que eu soube é que a cidade de Veneza possui 60.000 moradores na ilha e cerca de 100.000 pombos! Tem muito mais pombo que gente! Acredite.

Quando a gente chegou por lá ainda era muito cedo e a gente ficou sentado num daqueles Café's chiquérrimos e que cobram os olhos da cara por um copo d'água. Era hora de descansar um pouco apreciando aquela bela praça.

Estávamos praticamente sós ali. Uma ou outra pessoa passava. Zorbão, que dorme até em chão de trem, achou o seu lugar numa daquelas mesas e até roncou. Impressionante a capacidade do menino.

Aproveitei que tinha a praça só pra mim e tirei algumas fotos desse lugar de beleza singular.

Depois de algumas horas apreciando o lugar, a gente, que estava muito cansado, resolveu seguir até o albuergue pra podermos fazer o check in, quem sabe, e dormir um pouco. Já eram quase 10h da manhã e nós esperávamos que o albuergue nos aceitasse pra fazer o check in.

Compramos o que viria a ser um objeto de valor inestimável para nós: um mapa! Em todas as cidades dão mapas de graça pra você mas aqui em Veneza a gente teve que pagar 2,50 euros.

Veneza foi um dos lugares mais caros que a gente visitou. Tudo era muito caro. Até justifica-se porque é um lugar de gente "bacana". Sempre tem uns ousados como eu que aparecem por lá mas no geral é gente chique que anda por aqueles chiques becos e que chega em fantásticos navios.

Com mapa em mãos a gente chegou no nosso destino. Paramos em frente ao número 5 e vimos que ali não parecia um albuergue. Parecia um prédio de apartamentos qualquer. Tentamos tocar alguma campainha mas sem resposta. Nesse momento a Elen me explica o acontecido e só agora eu entendi porque as direções indicadas no site do albuergue não faziam o menor sentido e levavam a gente pra outra parte da cidade.

Antes de vir até esse albuergue a gente deveria se registrar num outro albuergue do outro lado da cidade. Foi então que eu entendi tudo. O único problema era que o outro albuergue ficava perto da estação de trem. A gente teria que andar por toda a cidade novamente!

Nós tínhamos tido um dia difícil no dia passado. Fomos a praia inclusive. Quem não quer dormir um pouco depois da praia?! Estávamos a mais de 24h com uma mochila nas costas. Além disso a gente passou a noite toda acordados! E tínhamos andando por bastante tempo até chegarmos na Praça de São Marcos. A gente era só cansaço! Como diz a Léa a gente era "só o pó"! A idéia de andar até o outro lado da cidade novamente soava como tortura.

Eu queria muito ir de Vaporetto até lá mas depois de uma pequena discussao me convenceram a andar até lá. Foi difícil nego véi. Foi difícil.

Cada ponte que a gente tinha que subir era como ter que subir o Monte Everest. E foram muitas pontes. Eu tinha a clara impressão de que cada perna minha pesava 100Kg! Nunca tinha sentido nada parecido. Nunca tinha me sentido exausto daquele jeito. Eu realmente fazia força pra levantar a perna pra conseguir subir mais um degrau.

Depois de muita ponte e suor a gente chegou ao albuergue. Devia ser umas 11h ou mais. A primeira pergunta que a gente fez foi quando a gente podia entrar no nosso quarto e ele disse que às 14h apenas. Aquilo foi a pior notícia que ele poderia nos dar. Nesse momento eu queria deitar no chão e dormir de tão cansado. Só queria um chão pra dormir apenas.

O cara do albuergue foi um dos poucos que nos atendeu bem e sempre procurava brincar com a gente. Brincava até demais na verdade. Ele ficava perguntando a vida toda da gente. Parecia que trabalhava pra imigração.

No meio do papo ele disse que a gente poderia ir até o quarto da gente mas que uma menina ia passar pra limpar até as 14h. A gente já ficou mais aliviado. Pelo menos chão a gente ia ter pra dormir.

Saimos de lá com a chave na mão e decidimos pegar o Vaporetto dessa vez. Se a gente tivesse pegado o Vaporetto antes não iria custar nada mais essa viagem. Isso me irritou profundamente que agora todos concordaram em pegar o Vaporetto. Depois de andarmos 1h nas condições que estávamos.

A rigor a gente teria que pagar 5 euros por aquela viagem mas aquele negócio é tão bagunçado que eu não queria pagar não. Não queria pagar pra não dar ozadia porque a gente não veio de Vaporetto e por que a viagem de volta era super curta.

A gente entrou naquele barco sem ter a mínima idéia de onde comprar o bilhete. Dentro do barco só tinha o motô e o carinha que atracava o barco e abria o portão. Eu não vi ninguém mostrando nada! Se alguem virasse pra mim e perguntasse do bilhete eu dizia que não tinha e que queria comprar. Eu já estava retado que tinha pagado 16 euros em Roma SEM necessidade. E o pior foi que eu tava PUTO DA VIDA por causa do trem na noite passada. Ainda tive que pagar 15 euros a mais pra poder sentar em alguma poltrona. Ah! Não vou pagar essa merda não.

O Zorbão deu logo uma crise dizendo que queria pagar. Se fosse pra pagar que pagasse na hora de vir e não agora. Ficou todo nervoso. Eu acabei ficando nervoso por causa do nervoso dele. E eu disse: "Rapaz, fica na boa! Se alguém vir a gente paga o que tem que pagar!". Só eram 2 pontos na frente que a gente precisava ficar no barco. Questão de segundos.

Daí a gente chegou no ponto da Ponte Rialto e desceu por lá. Mesmo assim o transporte italiano ainda estava me devendo muitos euros perdidos...

Dessa vez a gente chegou no albuergue com a chave do quarto na mão. Foi só aí que a gente percebeu que a gente tinha na verdade alugado o que eles chamam aqui de Guest House.

Guest House é como um albuergue, que aqui chama-se Hostel, só que só tem você na casa. Então a gente tinha 2 quartos, sala, cozinha, banheiro, tudo pra gente somente. Foi só alegria. E tudo isso perto da Praça de São Marcos e por um preço super bom. Era só alegria mesmo.

Na primeira foto Léa mostra a nossa rua com uma mão e com a outra ela segura não sei o quê! A segunda mostra a primeira metade do nosso apartamento e na última a visão da nossa janela dos fundos. É ou não é um favelão?

Eu e Léa largamos as coisas e fomos procurar um supermercado pra comprar umas coisas pra comer que a comida em Veneza é pela hora da morte!

Pra nossa sorte o supermercado ficava a 100m de nosso apartamento. Compramos o suficiente para o almoço de hoje e o café de mais tarde.

Voltamos pro apartamento e fizemos uma massa a quatro mãos. Eu me sinto tão feliz em poder falar isso. Há 6 meses atrás eu ia, provavelmente, ficar olhando a Léa fazendo as coisas. Mas dessa vez eu pude até dar uma diretrizes!!! Acreditem! Apesar da cara de confusa da Léa a nossa comida ficou boa.

Depois disso era hora de dormir. Devia ser umas 14h e ainda estávamos completamente exaustos. Caímos em sono profundo e só acordamos às 21:30h.

Resolvemos então conhecer a noite de Veneza. Passeamos pela cidade. O clima era ótimo. A cidade estava animada, as pessoas pareciam felizes, a temperatura era agradável, estávamos descansados e felizes por estarmos alí.

Passamos por algumas lojas interessantes. Muitas deles vendem as tão famosas máscaras venezianas.

Continuamos o nosso passeio até chegarmos a Praça de São Marcos. Ela estava linda, toda iluminada. O clima era uma delícia. Havia 3 ou mais pequenas bandas instrumentais tocando. Era perfeito aquilo.

As bandas ficavam se revezando. Tocavam 3 ou 4 músicas e davam a vez a próxima.

A noite era estrelada, a cidade a mais romântica. O clima não poderia ser melhor. Eu abracei forte a Léa e a gente ficou ouvindo algumas músicas. Pra qualquer canto que você olhasse víamos gente sorrindo, casais abraçados, gente dançando em plena praça. Tudo, naquele momento, era mágico e especial.

De repente começa a tocar aquele tango de Carlos Gardel do filme Perfume de Mulher: Por Una Cabeza. Eu sempre achei aquela música sensacional e ela sempre me remetia àquela cena fantástica do Al Pacino. Eu e a Léa arriscamos alguns passes de tango meio desajeitados. Dois moleques em Veneza.

Alguns passes de tango incompletos e pisões nos pés e a gente resolve desistir do tango e nos abraçamos. A música continuava. Eu olhei pra ela nos olhos, trocamos algumas juras de amor e naquele momento todos desapareceram da Praça de São Marcos. Naquele momento só existia aquela música, eu e a Léa. E ficamos alí, de olhos fechados, por alguns minutos. Só eu e ela naquela praça completamente vazia.

Logo depois tocou Moon River. Que música combinaria melhor que essa para aquele exato momento? Nós ali, apaixonados, em Veneza, em plena Praça São Marcos. Foi um momento que eu vou guardar pra sempre comigo. E, provavelmente, sempre que eu ouvir o tango de Gardel ou Moon River eu vou me lembrar desse momento.

Depois de algum tempo e muitas músicas fomos caminhar margeando o Canal Grande. Ficamos alguns minutos por lá conhecendo o lugar, aproveitando a noite de estrelas, nos beliscando pra termos certeza que aquele momento era real.

Voltamos tarde de volta ao apartamento pra dormirmos que amanhã tem mais Veneza pra curtir.

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