12 de outubro de 2004

London, London

Quando eu acho que estou bem, que não sinto mais tanta saudade de casa, quando penso que estou resignado a viver longe de minha família e amigos me acontece isso...

Hoje pela manhã eu lembrei que era aniversário de minha Tia Valma. Lembrei e logo depois esqueci como de costume. Passei o dia todo sem lembrar. Deitei a noite pra dormir e fiquei pensando na vida. Pensando na Léa, pensando na família, nos amigos, na viagem de volta pro Brasil que está chegando.

Como um estalo me veio a mente que era aniversário de minha Tia Valma. Ainda era. Pelo menos no Brasil com 4 horas mais cedo. Liguei pra casa dela mas ninguem atendeu. Lembrei que minha mãe tinha falado que iam todos para Cabuçú. Lembrei que era feriadão. Liguei pra lá...

Falei com minha Tia Valma. Desejei felicidades e parabéns. Lembrei de um sonho que tive com ela semana passada. Estávamos em Cabuçu, na mesa de café do fundo. Estávamos eu, Tia Valma ao meu lado e do outro lado Mariana, minha priminha, e outras pessoas da família que não me lembro quem eram. Eu estava com o pé muito frio e isso refletiu no sonho. Reclamei que o meu pé estava muito frio. Nessa hora Tia Valma fala com o pessoal da mesa que o meu pé ficava sempre muito frio, o que era verdade. E lembrou de uma brincadeira que eu fazia pondo o pé gelado nela na época que eu morava na casa de meu Tio Dego. Essa brincadeira nunca existiu na realidade mas talvez por brincar com os pés de Tia Valma seja fazendo cócegas ou estralando os dedos dela isso veio a tona. Tia Valma sempre tão indefesa e eu sempre brincalhão nunca perco uma oportunidade...

Lembro que quando eu lembrei no sonho dessa brincadeira que nunca existiu eu deitei nos braços de Tia Valma e chorei como uma criança. Soluçando mesmo... A Mariana perguntou por que eu tava chorando e Tia Valma disse que "É saudade Mari. É saudade!".

De repente eu acordo do sonho, com os olhos cheios de lágrimas, coração tão apertado mas tão apertado que eu só consegui continuar chorando... E fiquei chorando ainda por alguns minutos com pena de mim mesmo...

Até então eu não achava que estava com tanta saudade de casa. Achei que era só um fato isolado. Mas hoje depois de falar com Tia Valma eu falei com minha mãe e depois com Camila e depois com meu pai.

Meu pai falou que tinha comprado um CD de José Augusto, eu acho. Que tinha a música London, London nele. E ele me perguntou se a música era triste. Ele disse que nessa versão uma parte da música é cantada em português e disse que a música falava de solidão e parecia triste. Eu disse a ele que não lembrava da letra mas que ia olhar.

Mandei beijos a todos com uma saudade enorme no coração... A família inteira estava lá se divertindo. Minha mãe e Camila roucas de tanto rir. Ao fundo eu ouvia o videokê... Eles estavam fazendo competição no videokê como sempre acontece. Me deu uma vontade tão grande de estar lá no meio com todos eles... Tão grande.

Resolvi olhar a letra de London, London e acabei não aguentando e caí no choro. Eu me identifiquei tanto com a música que não teve como não desmoronar daquele jeito. Pra mim é tão claro cada palavra que o Caetano escreveu. Eu me ví em cada linha da música. Cada palavra.

Quando ele fala do povo apressado mas calmo, do guarda agradecido por ajudar, do céu cinza, da grama verde e dos olhos azuis, de andar sem rumo e não ter ninguém pra dizer olá... Enfim...

Chorei de saudade de casa. De saudade dos amigos. Do Brasil. De saudade de tudo.
Chorei por me sentir sozinho, sem ter pra onde ir e nem pra quem dizer olá.
Chorei por saudade. Por me sentir incapaz. Por me sentir pequeno nisso tudo.

Liguei pra Léa pra desabafar. Pra pedir colo. Um colo distante mas um colo. Melhor não ligar pra casa de volta pra não deixá-los preocupados ou cortar o clima gostoso que estava por lá... Minha agonia logo passa. Sempre passa...

Depois de muitas outras lágrimas ela conseguiu me acalmar e eu vim escrever isso pra aliviar mais o coração.

Deixo aqui pra vocês a letra de London, London pra vocês verem como o Caetano conseguiu colocar tanto em tão poucas linhas. Talvez vocês não entendam exatamente o que a música quer dizer mas pra mim caiu como uma luva, infelizmente.


London, London
Caetano Veloso

I'm wandering round and round, nowhere to go
I'm lonely in London, London is lovely so
I cross the streets without fear
Everybody keeps the way clear
I know I know no one here to say hello
I know they keep the way clear
I am lonely in London without fear
I'm wandering round and round, nowhere to go

While my eyes go looking for flying saucers in the sky

Oh Sunday, Monday, Autumn pass by me
And people hurry on so peacefully
A group approaches a policeman
He seems so pleased to please them
It's good to live, at least, and I agree
He seems so pleased, at least
And it's so good to live in peace
And Sunday, Monday, years, and I agree

While my eyes go looking for flying saucers in the sky

I choose no face to look at, choose no way
I just happen to be here, and it's ok
Green grass, blue eyes, grey sky
God bless silent pain and happiness
I came around to say yes, and I say

While my eyes go looking for flying saucers in the sky


London, London
Caetano Veloso

Eu estou vagando por aí, sem ter pra onde ir
Eu estou sozinho em Londres, Londres é encantadora assim
Eu cruzo as ruas sem medo
Todos mantem o caminho livre
Eu sei, eu sei, ninguem pra dizer olá
Eu sei que eles mantem o caminho livre
Eu estou sozinho em Londres sem medo
Eu estou vagando por aí, sem ter pra onde ir

Enquanto meus olhos saem procurando por discos voadores no céu

Domingo, segundo, outono passam por mim
E pessoas se apressam tão calmamente
Um grupo se aproxima de um policial
Ele parece tão grato em ajudá-los
É bom viver, ao menos, e eu concordo
Ele parece tão grato, ao menos
E é tão bom viver em paz
Domingo, segunda, anos e eu concordo

Enquanto meus olhos saem procurando por discos voadores no céu

Eu escolho rosto nenhum pra olhar, escolho nenhum caminho
Acontece apenas de eu estar aqui, e está tudo bem
A grama verde, olhos azuis, céu cinza
Deus abençoe a dor silenciosa e a alegria
Eu vim pra dizer sim, e eu digo

Enquanto meus olhos saem procurando por discos voadores no céu

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